12 outubro 2012

Crianças, uma reflexão necessária em seu dia!

 Hoje é Dia da Criança, que além de ser esse serzinho especial, cuja essência todos deveríamos carregar dentro de nós para o resto das nossas vidas, é matéria prima de meu trabalho diário. Por isso também olho pra elas hoje como educadora e publico aqui uma matéria muito interessante que a Rede Pró-Menino - Fundação Telefônica divulga aqui. Hoje as crianças estão expostas a muitas situações de risco e quando falo risco, me refiro além dos perigos físicos, os morais, impostos pelos adultos, causando reflexos tristes em seu comportamento. Depois, os próprios adultos tentam tratar a criança  com desvios de conduta ou comportamento, mas muitas vezes, o problema  está na causa, que essa sim, deveria ser investigada e tratada. Trabalho infantil, pedofilia, falta de limites, descaso, abandono,  incentivo ao consumismo exagerado sáo alguns exemplos do que citei. Não adianta encher a criança de presentes caros para preencher o vazio deixado pela ausência e não sentar no chão para brincar junto ou contar uma história. Melhor construir com ela um brinquedo de sucata, dar a atenção  necessária e a felicidade está garantida. Tenho construído com as crianças brinquedos de sucata e entre eles , como parte de um projeto, um cavalinho de pau e vejo o quanto essa atividade simples as tem deixado felizes e o quanto brincam com um brinquedo que não custou nada e ainda ajuda a salvar o planeta reaproveitando o lixo. E vejo com alegria que muitas outras crianças da cidade foram presenteadas também com um cavalo de pau. Crianças precisam de exemplos bons para serem o que esperamos delas. Nas atitudes mais simples, como respeitarmos uma fila, mesmo que essa seja composta de crianças, que em tamanho são menores, mas em grandeza, nem se compara.

Caros leitores, leiam o texto a seguir.


O QUE ESTAMOS FAZENDO COM NOSSAS CRIANÇAS?


Torna-se cada vez mais comum crianças e adolescentes serem encaminhados a
serviços de saúde porque apresentam problemas na escola. Esse fenômeno não é novo e
tem sido chamado de medicalização da educação: trata-se de reduzir questões
escolares, e consequentemente sociais, a problemas médicos. Isso vem se intensificando
a partir do uso de psicoestimulantes para controle de hiperatividade e incremento da
capacidade de atenção. Também tem se tornado comum crianças e adolescentes serem
encaminhados a serviços de justiça por razões semelhantes, sobretudo quando assumem
formas agudas ou tendem a se cronificar, evidenciando, assim, outro fenômeno também
conhecido entre nós, a chamada judicialização, ou seja, a redução das mesmas
questões a problemas de justiça. Se no primeiro caso assistimos à administração de
nocivas drogas psiquiátricas a sistemas nervosos ainda em formação, no segundo nos
assombramos com o selamento de destinos à margem da sociedade e, pior, operado por
profissionais encarregados de proteger e tratar a infância.
A apresentação sucinta de um caso pode deixar mais claro o que estou afirmando.
Wilson era um aluno de 5º ano quando o conheci. Ele costumava ter “surtos” – assim
eram chamados, pelos agentes escolares, seus ímpetos de indisciplina e aparente
descontrole. Em um desses ímpetos, a escola chamou a polícia, que a muito custo o
controlou e decidiu por enviá-lo ao hospital em uma ambulância. O acontecimento é
assustador, ainda mais se tratando de um menino de 10 anos. Mas, dirão os da escola,
seu comportamento atingiu um nível inaceitável: agredia colegas e educadoras, gritava,
xingava, saía correndo pelos corredores do prédio. Tanto é que havia sido diagnosticado
por um especialista como portador de Transtorno do Déficit de Atenção com
Hiperatividade (TDAH), tendo sido lhe receitado Ritalina®. E, como estamos em um
município em que esse medicamento é distribuído gratuitamente à população, não
haveria razões para sua destemperança, a não ser por negligência do aluno ou de sua
família.
É preciso que analisemos com calma. O caso é complexo e não aceita respostas
simples, o que, de cara, já nos faz desconfiar de uma saída baseada apenas no controle
medicamentoso. A quem se dedica a estudar seriamente o fenômeno humano, torna-se
claro que estabelecer causas lineares entre causa e efeito é, no mínimo, ingenuidade. Há
que se pensar, sempre, em multideterminação, o que afasta a resposta tão frequente
quanto simplista de que o comportamento de Wilson é efeito de mau funcionamento
cerebral. A medicina não dispõe ainda de exames que afiram desequilíbrios
neuroquímicos, ainda que estes desequilíbrios sejam propagandeados como causas
inequívocas de supostos transtornos. Além disso, autocontrole voluntário do
comportamento e da atenção são habilidades ensinadas e aprendidas, e não simples
efeitos do funcionamento cerebral. Portanto, é mais acertado pensarmos que o
funcionamento cerebral é efeito de processos de aprendizado social, não o contrário.
Assim, as raízes da forma como Wilson se comporta devem ser buscadas nas suas
relações com o contexto que o envolve, ao longo de toda sua existência. Isso significa
levar em consideração sua vida dentro e fora da escola; sua história familiar e seu
percurso na instituição. Escola e família, porém, também devem ser contextualizadas
social e historicamente. É preciso saber a que classe social pertence a família, a que
condições de vida está sujeita, qual a qualidade das políticas públicas de bem estar social
a que tem acesso, quais as transformações tecnológicas, econômicas e sociais mais
amplas que acabam influenciando o comportamento não só de Wilson e sua família mas
de todos nós. Do mesmo modo a escola: qual a sua qualidade? Os professores são bem
pagos, têm boa formação, boas condições de trabalho e participam democraticamente
das decisões institucionais? Os conteúdos e métodos de ensino são adequados? Toda
essa problemática é dissimulada quando apenas ministramos, ou tentamos ministrar,
comprimidos de Ritalina® para Wilson.
Mas há quem ganhe com isso, evidentemente. Em primeiro lugar a indústria
farmacêutica com seus lucros astronômicos, capazes de financiar pesquisadores que
divulgam o transtorno e o tratamento como verdades científicas avançadas e
inquestionáveis. O sistema de saúde mental infantil do município também ganha, pois
oferece com menor gasto uma resposta à demanda, uma vez que não se dispõe a lidar
com a complexidade envolvida na questão. A escola e a professora de Wilson, caso ele
tome o remédio, também ganham: se asseguram que o problema está apenas no aluno
ou em sua família e não precisam, assim, questionar seu próprio trabalho. Então, quer
dizer que o remédio funciona? De fato, os psicoestimulantes têm a capacidade inicial de
aumentar a performance das funções cognitivas, entre as quais a capacidade de focar a
atenção. É por esse motivo que a cocaína, ou mesmo a Ritalina®, são utilizados por
profissionais ou estudantes em momentos estratégicos ou de pressão.
Uma criança medicada na sala de aula é, inicialmente, uma criança focada e quieta.
Sim, porque, paradoxalmente, o estimulante faz com que as crianças se aquietem, a
ponto de se tornarem como zumbis. Na verdade, zombie-like é um sinal de toxicidade da
medicação, cuja lista de reações adversas é alarmante: nervosismo, insônia, cefaleia,
discinesia, tontura, dor abdominal, humor depressivo transitório, retardamento do
crescimento etc. – a lista é grande; basta consultar a bula do medicamento. Seu consumo
prolongado é sugerido, por certas pesquisas, como determinante de peso para a
drogadição na adolescência e a ocorrência de pensamentos suicidas. Há longo prazo,
parece que o medicamento induz a efeitos inversos do que se propunha a realizar:
agitação motora e dificuldade de aprendizagem. Esse é o preço que estamos dispostos a
pagar para calar nossas crianças?
Fiquei inicialmente animado quando soube que o caso de Wilson seria discutido por
profissionais de saúde, assistência social e educação, numa espécie de reunião interserviços.
Nessa reunião, foi comentada sua complexa situação familiar: mãe viciada em
cocaína, capaz de se prostituir para conseguir a droga; pai enfraquecido; relação
erotizada entre mãe e filho, ambos refratários a prescrições medicamentosas. Isso sem
contar outros agravantes comuns a vidas castigadas pela pobreza. A discussão foi bem
rica, pois contou com diversas perspectivas profissionais provenientes de diferentes
serviços públicos. Porém, algo unificou a diversidade: a sensação de impotência diante da
complexidade do caso. Optaram então por acionar o Ministério Público, a fim de que este
pressionasse Wilson e sua mãe a aderirem à medicação. Assim, um caso que
manifestava, a seu modo, a difícil condição social a que são sujeitas inúmeras famílias em
nossa sociedade, um caso que tinha como uma de suas vias de expressão condutas
antissociais na escola, expressão esta transformada em patologia a ser medicada, agora
encaminhava-se a se tornar um caso de justiça.
Não é aceitável que continuemos a culpar e reprimir aqueles que mais sofrem as
condições aviltantes de nosso funcionamento social. Não é possível que continuemos
formando profissionais que se utilizam de meios pretensamente eficazes, neutros,
“científicos”, para perpetuar formas de submissão dos deserdados e de
desresponsabilização das instituições sociais. São necessários investimentos maciços em
melhores condições de vida, em relações sociais humanizadas e em condições dignas de
trabalho nas instituições de educação, saúde e assistência social, não na indústria
farmacêutica nem em aparatos de controle jurídico e policial de problemas sociais.


Fábio Alexandre Gomes
Assistente Social - Cress 33.761/9ª região
(12)9737-5494

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